Fasepa encerra 1° ciclo do Projeto ‘Cria das Letras’ com reflexão sobre identidade e racismo

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No último dia (7), a Fundação de Atendimento Socioeducativo do Pará (Fasepa), por meio da Unidade de Atendimento Socioeducativo (UASE 1), realizou uma programação especial, para o encerramento do 1° Ciclo do Projeto “Cria das Letras”. A iniciativa é uma parceria entre a Fasepa, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a Companhia das Letras, e tem como objetivo promover a leitura e o conhecimento entre jovens em cumprimento de medidas socioeducativas, focando no desenvolvimento educacional e pessoal de cada um dos envolvidos.

O projeto, por meio da distribuição dos livros selecionados pela Companhia das Letras e apresentados para a escolha dos socioeducandos, foi executado através de atividades programadas pela equipe de servidores que receberam formação para atuar como mediadores dentro da unidade socioeducativa. O objetivo da atividade é estimular o pensamento crítico dos jovens e servidores que atuam na unidade.

De acordo com Nairim da Luz, pedagoga da UASE I, o espaço da leitura favorece a expressão dos socioeducandos por meio da leitura, produções escritas e artísticas, como desenhos e textos que revelam suas percepções e vivências da obra analisada. “O projeto foi implementado na unidade a partir das ações do Clube da Leitura, realizadas semanalmente. Neste primeiro ciclo, foram trabalhadas duas obras, “A Mágica Mortal”, de Raphael Monte e “De onde eles vêm”, de Jeferson Tenório. Durante os encontros, além da leitura compartilhada, foram desenvolvidas atividades pedagógicas voltadas à compreensão do enredo, análise dos personagens e a contextualização das obras e de seus autores”, destacou a pedagoga.

A programação de encerramento do primeiro ciclo do projeto contou com a participação de Jucilene Carvalho, a mãe Juci D´OIA, que ministrou uma oficina sobre a produção de Acarajé, abordando sua origem e destacando sua importância na culinária afro-brasileira. A oficina reforçou os temas centrais da obra analisada, como identidade, racismo, preconceito, exclusão, luta e sonho. Em seguida, uma roda de conversa reuniu convidados que superaram preconceitos e se afirmaram na sociedade, como a mãe Juci D´OIA e o psicólogo Alessandro Silva, que compartilharam suas experiências. A programação também contou com a presença de Raquel Amarantes, assistente técnica estadual do programa Fazendo Justiça, e outros representantes da área socioeducativa, além da gestora e servidores da unidade e os socioeducandos, que participaram do diálogo sobre as questões vivenciadas no projeto, fortalecendo a reflexão coletiva.

Jucilene Carvalho, a mãe Juci D´OIA, declarou que ficou muito sensibilizada com o convite para ministrar a oficina de culinária e participar da roda de conversa sobre essa temática, “é fundamental dialogar sobre questões tão presentes em nossa sociedade. Falar sobre gastronomia afro, que é cheia de afeto, ancestralidade e identidade, sem se restringir ao religioso, é um encontro com a nossa africanidade, permitindo que cada um se entenda como ser humano, especialmente em um contexto de privação de liberdade. Este projeto de leitura oferece uma oportunidade de reflexão sobre quem somos, de onde viemos e como chegamos até aqui, e mostra que, por meio da leitura, é possível alcançar uma liberdade plena. O racismo é estrutural e precisamos combate-lo diariamente para que jovens, homens e mulheres não sejam aprisionados no cárcere, nem na utopia de que precisam se conformar a um padrão para serem vistos e existir na sociedade. Ao abrir espaço para a fala, buscamos fortalecer o amor e a humanidade que existe em cada um”, disse.

Para o psicólogo Alessandro Silva, participar do projeto foi uma experiência intensa. Falar sobre um contexto de sofrimento social, que muitas vezes é muito sensível, tornou o processo ainda mais significativo. Para ele, a importância de mostrar que existe representatividade em lugares onde, por muito tempo, se disse que não havia, é crucial. “Acredito que a leitura tem um grande potencial transformador e que esse é o verdadeiro potencial do projeto, proporcionar aos socioeducandos um novo olhar sobre a vida, uma relação com a educação baseada em cuidado, aprendizado, crescimento e infinitas possibilidades.

Alessandro destaca ainda que, em muitos momentos, ao falar com os socioeducandos, teve a sensação de estar falando sobre si mesmo. Ele tem certeza de que, por meio da escuta, da fala e da visualização de outras perspectivas, eles aprenderam muito. O livro De Onde Eles Vêm, para além da simples leitura e discussão, também proporcionou uma vivência que trouxe um espaço de humanidade através da educação. Esse foi um dos maiores legados que o projeto deixou, reforçou o psicólogo.

Esse momento marca a introdução de uma iniciativa inovadora, com potencial para impactar positivamente a vida de jovens que fazem parte do sistema socioeducativo do Estado, dando acesso ao poder transformador da leitura.

A assistente técnica estadual do programa Fazendo Justiça no eixo socioeducativo e representante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Raquel Amarantes, destacou a importância da parceria e do envolvimento de todos para garantir a efetividade do projeto, com o objetivo de alcançar resultados consistentes e ampliar seu impacto. “É perceptível o compromisso dos profissionais da Fasepa e da unidade com o projeto, eles assumiram com dedicação o clube da leitura e as ações educativas, e isso é fundamental para o engajamento e participação dos socioeducandos”, destacou Raquel.

O projeto é uma rede de incentivo à leitura que, além de beneficiar os jovens diretamente envolvidos, também colabora para a construção de uma sociedade mais inclusiva e com maior acesso à cultura e ao conhecimento.

Ao longo do primeiro semestre, o “Cria das Letras” foi fortalecido na unidade, e se consolida como uma ferramenta fundamental para reflexão e mudança de concepção, acerca de assuntos com relevância social, que permite aos socioeducandos e servidores, um diálogo respeitoso, sobre diversos assuntos e perspectivas.

A programação contou também com a presença da advogada da Fasepa, Anne Sousa, que ressaltou a relevância do tema discutido, destacando que a Fasepa tem se empenhado, por meio do Grupo de Trabalho (GT) da Diversidade, em desenvolver iniciativas com foco no letramento racial. Segundo Anne, o livro trabalhado no primeiro ciclo do clube da leitura desempenha um papel fundamental no fortalecimento desse processo, oferecendo uma contribuição significativa para a promoção da conscientização e reflexão sobre as questões raciais.

O “Cria das Letras” neste primeiro ciclo, se consolida como uma ferramenta significativa para a reflexão e o diálogo sobre questões sociais, promovendo uma sociedade mais inclusiva e acessível ao conhecimento. Um jovem socioeducando, de 15 anos, expressou o impacto pessoal do projeto, relacionando a obra com sua própria experiência de enfrentar o preconceito. “Tá sendo muito bom participar do clube da leitura, tenho gostado dos livros. Esse livro escolhido, por exemplo, fala de raça, de preconceito, e eu sou preto. Minha mãe sempre me falou que eu devia me respeitar e me conhecer, me pedia para ignorar o preconceito, para não me importar com o que falavam de mim.”, falou o jovem.

O projeto não apenas proporcionou um espaço para aprendizado, mas também incentivou a reflexão sobre temas cruciais como identidade, racismo e inclusão, oferecendo aos jovens uma oportunidade de crescimento e autoconhecimento.

Texto e Fotos: Dani Valente (Ascom Fasepa)

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